quarta-feira, 19 de março de 2008

- INTERVALO -

Quem te disse ao ouvido esse segredo
Que raras deusas têm escutado -
Aquele amor cheio de crença e medo
Que é verdadeiro só se é segredado?...Quem te disse tão cedo? Não fui eu, que te não ousei dizê-lo.
Não foi um outro, porque não sabia.Mas quem roçou da testa teu cabelo
E te disse ao ouvido o que sentia?Seria alguém, seria?Ou foi só que o sonhaste e eu te o sonhei?Foi só qualquer ciúme meu de ti
Que o supôs dito, porque o não direi,
Que o supôs feito, porque o só fingi
Em sonhos que nem sei? Seja o que for, quem foi que levemente,
A teu ouvido vagamente atento,
Te falou desse amor em mim presente
Mas que não passa do meu pensamento
Que anseia e que não sente? Foi um desejo que, sem corpo ou boca,
A teus ouvidos de eu sonhar-te disse
A frase eterna, imerecida e louca -
A que as deusas esperam da ledice
Com que o Olimpo se apouca.

(Fernando Pessoa)

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